Aprender Design

2 de jun de 2025

Por que todo mundo está obcecado com interfaces de chat?

Zeh Fernandes

Zeh Fernandes

Founding Designer na Resend e Professor no Base Design de Produtos Digitais

Tem tirado meu sono ver a adoação da interface de chat como o Santo Graal da interação humano computador. Eu entendo que chat é poderoso. Você pode simplesmente pedir algo e ter resultados rapidamente. Mas como designer de interface, não consigo deixar de sentir que os produtos estão esquecendo uma lição importante. É como se estivéssemos apenas jogando uma caixa de chat em tudo e achando que está resolvido.

Criar uma interface não é simplesmente colocar botões, texto e ícones numa tela. É um processo de entender a tecnologia por trás, as intenções do usuário e traduzir toda essa complexidade em uma camada que possibilite essas interações. Gosto de pensar que interfaces são um vocabulário que um produto expõe para permitir um dialógo entre homem e computador.

O uso de linguagem natural através de LLM é um novo paradigma que pode ajudar a expandir esse vocabulário. O problema que enfrentamos agora é que estamos tratando isso como a solução definitiva para tudo.

O Problema com Interfaces de Chat

A linguagem natural é ótima para começar algo novo — é mais rápido do que ficar clicando por aí, mas nem sempre é a melhor interface para atingir o que se almeja.

A linguagem humana não foi feita para precisão. É por isso que temos poesia, e diferentes maneiras de dizer a mesma coisa. A invenção das linguagens de programação surgem exatamente para resolver essa ambiguidade que a linguagem humana possui. Máquinas precisam de comandos estruturados e previsibilidade.

Imagine pedir para uma IA uma cor que "transmita liberdade". Isso é incrivelmente subjetivo. Ou tentar ajustar pedindo mais vermelho, mais azul repetidamente em uma caixa de texto. Da mesma forma, se linguagens de programação fossem inteiramente baseadas em linguagem natural, teríamos um número avassalador de efeitos colaterais porque ambiguidade leva a resultados indesejados.

Se você quer manipular cores, uma interface bem projetada é melhor que linguagem natural. Uma roda cromática oferece muito mais controle e precisão do que tentar descrever uma cor para uma IA.

A linguagem natural só pode nos levar até certo ponto

Este é o problema central do chat: é ótimo para começar, mas quando você precisa de precisão, ele falha. Você consegue chegar a 80% de uma solução, mas os últimos 20% — a parte onde você refina e torna as coisas mais únicas e menos homogêneas — precisa de interfaces melhores.

A história nos mostrou que a interface certa faz toda a diferença. Doug Engelbart, o criador do mouse, demonstrou isso quando amarrou um tijolo em um lápis. Simplesmente colocar interfaces de chat em todos produtos é amarrar um tijolo.

Lembram do conceito de interface como vocabulário do sistema? Um prompt não está longe disso. É uma lista de contexto que enviamos ao sistema.

Adicionar controles precisos a qualquer interface de chat também torna as ferramentas de IA mais acessíveis. Nem todo mundo é falante nativo de inglês, e depender apenas de prompts cria uma barreira. Uma interface com funções claras fornece uma maneira de interagir com IA sem precisar de um texto perfeitamente formulado.

Voltando à pergunta inicial...

Por que as pessoas de produto estão obcecadas? Muito disso vem da condição humana de buscar soluções únicas para tudo. Em vez de fazer o trabalho real: conversar com pessoas, entender do que realmente precisam, compreender os requisitos do sistema e sentar para projetar centenas de alternativas. Se você simplesmente joga uma caixa de chat sem pensar direito, ela se torna apenas um elemento brilhante, não uma ferramenta para resolver as intenções das pessoas.

Em segundo lugar é a ilusão de inovação que todo o hype da IA está trazendo para a indústria. Adicionar uma interface de chat brilha nas demos, mas deixa a desejar no uso diário.

Não tenho certeza exata de para onde o design de interface está indo, mas acredito que ainda há espaço para explorar novas formas de interagir com computadores — formas que aprimorem como pensamos, criamos e resolvemos problemas, em vez de forçar os usuários a soluções padronizadas. Para alcançar isso, precisamos nos envolver com LLMs, mapear possibilidades e expandir o vocabulário. Só então seremos capazes de projetar interfaces que verdadeiramente aumentem a relação entre humano e máquina.

Este texto está disponível em inglês no site do Zeh Fernandes. Leia aqui.

Zeh Fernandes é Founding Designer na Resend e professor na matéria Pensamento Computacional no curso de formação Base Design de Produtos Digitais.

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